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Vista de Delft, Vermeer

Foto do escritor: ABM ABM

Calculo que entre a gente de valor não exista nada mais prevalente do que a memória de algo cintilante ao toque ocular. É a sensação que tenho ao ver este magnífico quadro de Joahnnes Veermer, “A Vista de Delft”. Marcel Proust era apaixonado por este quadro. Numa das passagens de Em Busca do Tempo Perdido, livro que todos deveriam ler, inclusive eu, uma das personagens simplesmente enfarta (e morre) ao contemplar a tela. Deve ser outra vertente da “boa morte” (eutanásia) inventada pelos gregos.


Há algo de aterrorizante e sedutor na paisagem que figura o retângulo. Todos os elementos possíveis estão expostos; céu, terra, ar, e fogo… fogo? fogo. É o fogo que flameja a vista de quem vê a vista.


As camponesas parecem estar indiferentes à monotonia urbana da bela cidade de Delft. Só parecem. A tela sugere muito mais uma odisséia paradisíaca do que um mero instantâneo de um lugar.


Observe que a perspectiva nos dá primeiro a terra, depois a água e depois as casas, o que sugere uma “travessia”; repare que após a cidade, não há pináculos ou montanhas; existe apenas nuvens e uma nesga de céu, como a suspender as casas que flutuam por sobre a própria sombra que é criada sobre a superfície instável da água.


O apuro técnico da tela se dá pelas sensações causadas ao olhar as nuvens se precipitando por sobre os telhados; em primeiro plano as nuvens brancas, no segundo as nuvens negras a anunciar uma tempestade. Seria um prenúncio dos fenômenos celestiais prestes a se entrechocarem e causar distúrbios à frágil calmaria da terra, das casas e das pessoas? Pena que Vermeer morreu antes de eu poder perguntar isto a ele.


Vermeer é o símbolo da genialidade sobre a quantidade, o que não quer dizer muita coisa. Portinari pintou quase 6 mil quadros; parece que Vermeer não pintou nem vinte. Mas em arte, a quantidade não pode ser aferida como bom ou mau sintoma, nem juventude ou velhice pode ser usada como régua; Van Gogh pintou quase 900 quadros; Tarsila do Amaral parece que pintava melhor na juventude do que na idade madura.


Vermeer tinha o gênio de proporcionar leveza ao peso do quotidiano; como na bela A Leiteira, e mesmo peso à leveza, como na etérea Moça com Brinco de Pérola. Ele detinha o sotaque artístico que simulava um som, quando na verdade era uma tempestade. Grande Vermeer.

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Alex Bezerra de Menezes

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