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Uma Carta de Amor



Como seria uma carta de amor:


Se eu fosse escrever uma carta de amor à minha amada, a primeira coisa que faria era me despir das impurezas causadas pelo desamor.


Diria, no primeiro parágrafo, que ela é linda até de pijama; ensaboada e quando acorda. Quando acorda tem aroma de tulipa seu hálito que exala na expiração e que não só no aroma lembra tulipas: os cabelos desgovernados pelo endredom lembram sim as pétalas tulipianas no ápice da primavera de abril; vermelhas ou amarelas.


Diria que a maçaneta da porta do carro não combina com a sua mão; lhe pediria perdão futuro não pelo ato que premeditasse cometer, mas pelos do passado, cometidos por um amante sem coração.


Diria-lhe que a rotina será levada ao tribunal por tentar mornar o nosso amor; condenada, ela iria conspirar junto à imaginação para tornar todos os dias seguintes como aqueles primeiros repletos de açúcar e duplo afeto.


Diria também, embevecido pelas gotas do seu olhar, que ao te ver pela primeira vez meus sentidos entenderam enfim o que o seminário levou décadas para me ensinar: de onde vêm, como são, qual a matéria, a forma, o cheiro, o som, enfim: a essência dos anjos.


Diria por fim, em letras trêmulas de emoção, que saiotes, anáguas, longos, calças, treppings, colants, jardineiras, são meras formas de esculpir, em corpo estranho, a magia ímpar que nenhum estilista, exceto o celestial, ousaria confeccionar: uma vestimenta elaborada como nas crisálidas: fio a fio, geometricamente mágica, flácida, básica, ávida, plácida: entremeada num vestido gótico, pois ao fim, todo amante, é na verdade pródigo.


Seria assim uma hipotética carta de amor.




Escrito por Alex Menezes às 23h15


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