“Não bebas mais água, mas usa de um pouco de vinho por causa do teu estômago e teus freqüentes casos de doença” – 1 Timóteo 5:23. O apóstolo Paulo estava na Macedônia por volta do ano 64 d.C quando deu esta recomendação ao jovem Timóteo.
O vinho é a única bebida que não é exatamente uma bebida: é um estado de espírito. Esse precioso e secular líquido, que quando tinto tem um tom algo rubi (ou outra que os olhos e a ocasião escolherem), é uma espécie de jóia em mosto. Desde tempos imemoriais o cultivo das vindimas tem sido algo além de uma manifestação cultural. Existem vinícolas francesas com mais de 800 anos de tradição!
O segredo no fabrico de um grande vinho está no cuidado, na poesia, no “terroir”, no clima e na uva. A uva é o único fruto que concentra o aroma e o sabor de 632 substâncias e as transferem para o vinho; entre as tais, amora, morango, chocolate, couro, madeira, baunilha. Os mais excêntricos encontram “caramelos amanhecidos”, “asfalto úmido”, mas isso é coisa para os enochatos ou enobobos. Asfalto úmido. Tenha dó.
“Dai vinho aos amargurados de alma”. Provérbios 31:6.
Entre os romanos havia um costume antigo de dar vinho com tóxicos aos criminosos, a fim de amainar a dor da execução. Talvez fosse por isso que os soldados romanos ofereceram a Jesus vinho drogado quando o pregaram na estaca.
No universo do vinho, o sacro e o profano caminham juntos. Baco, deus grego do vinho é aqui representado por Caravaggio:
Existe também uma conotação especial ao romanesco no vinho e em todo o ritual que envolve sua degustação a dois: a garrafa como símbolo feminino e a rolha, o masculino. Como o ventre, a garrafa faz incubar o vinho, deixa-o respirar, se alimentar, crescer. Há quem pague dívidas de música com vinhos.
Toda a magia do vinho reside na arte de sentir seus aromas frutados, seu toque macio na boca, a inquietação salivar dos taninos ácidos a eriçar as pupilas degustativas.
A curiosidade é uma das maiores invenções da humanidade. Dom Pérignon era o responsável pela adega da Abadia onde mongeava as coisas e ficou curioso com a afirmação dos vinicultores de que certos tipos de vinhos fermentavam novamente depois de engarrafados. Nesse processo, os gases estouravam as rolhas ou arrebentavam as garrafas. Dom Pérignon então experimentou garrafas mais fortes e rolhas amarradas com arame, conseguindo obter a segunda fermentação dentro do recipiente. Assim, por causa desse patrimônio valioso que é a curiosidade humana, surgiu o vinho espumante batizado de Champagne.
Então, qual o melhor vinho do mundo? O Romanée-Conti de 6 mil dólares a garrafa ou o Chapinha de R$1,50? Na verdade, tudo é uma questão de dor de cabeça; a dor do primeiro na hora de pagar e a do segundo no dia seguinte. O resto é prazer e céu. Aliás, quando o nosso monge-herói bebeu pela primeira vez sua descoberta e as bolinhas de gás explodiram no céu da sua boca, ele não teve dúvidas: “Estou bebendo estrelas!”. Tin tin.
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