Agora, no dia 9 de outubro, se estivesse fisicamente vivo, John Winston Lennon faria 67 anos. “É tão estranho/ os bons morrem antes/ assim parece ser/ quando me lembro de você/ que acabou indo embora/ cedo demais...” é difícil imaginar o ex-beatle portador de 67 anos. Não combina com ele. Não combina com muita gente muita idade. Renato Russo, 36. Elis, 36. Raul Pompéia, 32. Noel Rosa, 26. Ayrton, 34. Janis Joplin, 27. Jim Morrison, 27. Kurt Cobain, 27. Jimi Hendrix. 27. James Dean, 24. Van Gogh, 37. Mozart, 36. Depois Alexandre aos 33, Jesus, 33. O mais curioso, o mais espantoso, é que nenhum deles morreu precocemente.
Quando, no dia 8 de dezembro de 1980 Mark David Chapman alvejou a voz de Lennon em frente ao mítico edifício Dakota de Nova Iorque, fez-se saber que morreu só uma pessoa. Uma simples pessoa. Lennon tinha de morrer; morreu. Sua vida conturbada, seu temperamento difícil, intempestivo, faria dele um cidadão problemático, se fosse ele apenas um mero cidadão. Incrível. Ele não era um gênio. E isto é o que o diferencia de tudo e todos. Inteligentíssimo, mas não gênio. O que Lennon fez com os Beatles não há precedentes na história moderna. Ele poderia sim, ter autoridade para dizer que “O Cristianismo vai acabar (...) hoje somos mais populares do que Jesus Cristo”; ato contínuo à fala, a turnê no Japão foi cancelada, pilhas de discos dos Beatles queimadas na Europa, Ásia e EUA. Não precisava, Lennon tinha razão. Nunca antes dele (s) o “pop” foi tão avassalador, divisor de águas; influenciador; cidades paravam nos EUA; os índices de crimes declinavam a zero quando eles se apresentavam nas cidades; em plena década de 60, no início das transmissões via satélite, 700 milhões (!) de pessoas viram pela TV o concerto “All You Need is Love”. A era Beatles que durou de 1962 a 1970 equivaleu ao impacto social da Gripe Espanhola, para ficar numa tragédia, ou, em menor proporção de sangue, a uma necessidade, como a Segunda Guerra. Depois daquilo, o mundo guinou para uma nova realidade jamais experimentada, libertação sexual, drogas, o viver sem as possibilidades ordinárias, desafiar a normalidade. O impacto dos meninos de Liverpool sobre a relação do homem com o mundo que o cerca, ouso, foi maior que o 11 de Setembro. Imensamente maior.
Mas Lennon morreu. Cantou de tudo; dos heróis das classes trabalhadores (The Work Class Hero) à pregação utópica da paz mundial (Imagine); do amor perdido e reconquistado (Starting Over); da devoção a um filho (Beautiful Boy); ao ódio-amor do abandono paterno/ materno (Mother) até a estranha “confissão” do suposto pacto feito com o diabo para alcançar a fama, (Dream#9); e um hino em homenagem a todas as mulheres que salvam seus homens das suas misérias (Woman). Lennon é muita coisa. Ouvir Mother é uma experiência lancinante, que queima as entranhas. O líder e a alma-guia do maior grupo musical de todos os tempos, lidava com muita dificuldade com suas limitações. Para essas pessoas, a certeza da finitude, mais que a brevidade da vida, é insuportável, daí a necessidade da morte breve, provocada ou aleatória, mas pontualmente breve.
Sua vida, marcada por tragédias, abandonado pelo pai e pela mãe, Julia, que o deixou aos cuidados da irmã, a tia Mimi, e quando a venerada mãe se reaproxima, morre atropelada na sua frente; na adolescência a morte do maior amigo e fundador da banda, por aneurisma (Stuart Stucliff) o esmaga para sempre. Aluno problemático, ficava todo o tempo no quarto, tocando guitarra. Sua tia Mim, preocupada, lhe dizia: “Isso não vai garantir o seu futuro”. Ganhou uma placa de ouro com essa inscrição. Na manhã daquele fatídico 08/12/80, o pára-medico, a última pessoa que o viu com vida, lhe perguntou na ambulância:
- Você sabe quem você é?
- I´m John Lennon.
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