Eu mesmo tenho muitos preconceitos; os coleciono. E não só os triviais, aqueles que não causam horror ao interlocutor, os politicamente corretos. Machado de Assis dizia que abominava as corridas de cavalos; o próprio animal ele odiava, por achá-lo um bicho impertinente, dizia que “o cavalo parece esmagar-nos com sua superioridade”. É interessante essa idéia; só não a compilo inteira aqui porque o autor dela já tem cartaz demais e eu nenhuns; quiçá dois, o seu e o da minha mãe.
Entre alguns preconceitos que venho nutrindo com galhardia está o de não assistir programas da Rede Record, forma solitária de punir seu dono malvado. Assim que descobri que a rádio Nova Brasil FM pertence ao Orestes Quércia, retirei-a do meu dial; não ouço mais. Ia boicotar o Minhocão que serpenteia defronte minha janela, mas aí o prejuízo seria só meu. A cidade de São Paulo está construindo a ponte mais espetacular do Hemisfério Sul por sobre o Rio Pinheiros, 138 metros, chamada “Estaida” pela engenharia de cabos que deixaria o grande Denocrato de Rodes com os cabelos em pé: está lá, podem ver, uma placa com a sigla OAS. De quem é a construtora OAS? Da família do ACM, aquele que muitos aborrecimentos tem dado ao Sr. Satanás na Disney Fire. Naturalmente irei passar ao largo da ponte, apesar da sedução de sua arquitetura, feito teia de aranha.
São medidas nulas e vazias, convenho. Mas já me satisfaz. E a satisfação ainda quando insossa aumenta a seretonina.
Mas já pensou se fossemos levar a ferro e fogo esses boicotes? Boicote… vamos fazer uma digressão etimológica, topa? Mesmo se não topar quem manda aqui sou eu, e a digressão será feita você querendo ou não, o máximo que pode fazer é apagar o monitor ou rasgar o papel, caso tenha imprimido está crônica. O termo deriva do capitão irlandês Charles Boycott, que num rolo dos diabos com a Inglaterra em fins do século XIX resolveu suspender a compra dos produtos ingleses e daí (heureca!) consagrou-se o termo.
É muito claro para mim que você está aí com um olhão desse tamanhão, ansioso pela revelação de um preconceito meu que deveras cause temor ou quando menos um processo; mas apesar de ser Flamengo, apesar de entender que don Diego é melhor não apenas que um único Pelé mais que uma coleção de Pelés, não sou tão bobo assim. Preconceitos divertidos todo mundo confessa que tem e com eles, à maneira de um Yorick moderno, faz rir a mesa, a festa e até o velório se o defunto for rico ou lazarento. Os preconceitos de sepultura são aqueles que a gente sabe que o amigo tem mais ignora por simples necessidade de coexistência.
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