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Espíritos Chineses no Brasil

Gosto mesmo é do Pé de Pano, ele me faz rir e sonhar. Pé de Pano é o simpático e frágil cavalo do Pica Pau. O Pica Pau voa, não sei porque precisa dum cavalo, Walter Lantz, o criador do pássaro, deve ter tido um haras ou um demônio. Pé de Pano chora, espirra, é meio assim carente de afagos. “Eu andava pobre/ tão pobre de carinho/ que, de tolo,/ até pensei/ que fosses minha”. Se eu assistir mais um episódio em que ele chora, se transformará em um dos meus heróis. Como Vincent, como Wittgeinstein, como o macedônio, FHB, o gênio de Assis. O governo chinês acabou de decretar uma lei que vale um suspiro, uma apoteose, uma alegoria. A partir de novembro de 2007, todo monge budista que ousar reencarnar terá de pedir permissão, antes da morte, (óbvio) ao governo chinês. Petição feita, os burocratas do Partido Chinês indicarão as condições adequadas para o milagre e a astúcia de querer voltar para mundo quando morrer sem enfim. Fico radiante. Plana meu espírito por entre os ventos que inspiraram o governo da China a tomar tão auspiciosa medida. Tem mais: sem autorização, e em lugares não aprovados como o Tibete (a província rebelde que a China reclama para si) a reencarnação passa a ser simplesmente ilegal. Não é um encanto? A matéria que saiu na imprensa (New York Times, Super Interessante, La Nación) não informa qual seria a punição para o espírito que desobedecer a nova lei. Deve existir algo como uma prisão espiritual, edificada com grades de fumaça e piso de gelatina. O espírito lá preso, não poderá apelar aos profissionais da lei: advogados estão proibidos de advogar no além, já causam transtornos demais por aqui. Naturalmente, não alcanço os motivos que levaram as autoridades chinesas a sentenciar a proscrição de um hábito mais antigo do que o próprio governo. As pessoas amam as tradições. Caim matou uma vez e seu ato solitário se tornou tão tradicional e geral, que continuamos a matar religiosamente, por um pedaço de pizza ou por gotas de petróleo; não importa o motivo e sim manutenção do costume. Juro por todos os yuans que tentei eliminar todas as possibilidades para compreender a proscrição; só encontro um meio de fazer uma anedota que você obviamente não compreenderá porque estará morto quando a entender e não havendo fronteiras nem dialetos no mundo dos mortos, não duvido que a jurisdição chinesa alcance todo o globo e, proibindo lugares onde se pode reencarnar não surpreenderá se eles também proibirem espasmos involuntários como o simples riso, esse bem quase tão democrático quanto a morte, quase porque já ouvi falar que há pessoas que não riem por nada, nem pelos juros cobrados no Brasil. Sou apesar de não parecer, um homem de pouca fé e por tal motivo me vejo levado a crer que não é privilégio de homens se tornarem rebeldes; espíritos também devem ter a prerrogativa e o animus para criarem motins no além, afinal eram todos homens e não há lei, exceto alguma exótica que libere tudo, que o homem não transgrida com paciência, carinho e afeição. Senhores espíritos reencarnem para onde bem apontarem seus narizes pós mortem só os aconselho (se me é permitido) a não tornarem às suas terras de origem, desembarquem aqui no Brasil, há cocos, sambas, tapiocas, novelas das 8 e uma torrente de leis louquinhas para serem violadas, sem qualquer prejuízo físico, financeiro ou espiritual, venham para cá. Este é o Pé de Pano: Escrito por Alex Menezes às 00h59

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