Sou viciado em notícias e dividendos. O primeiro vício me causa torpor e ansiedade, enquanto o segundo azia e mal-estar. Acompanhei no feriado constitucionalista de São Paulo (9 de Julho) nada menos que 8 telejornais; 4 de Tvs abertas e 4 de fechadas; li 4 jornais, dois de papel, dois on line e me dei conta de que estou noutro planeta ou tempo, como as personagens do seriado O Túnel do Tempo. É um admirável mundo novo, não como aquele de Aldous Huxley, mas este obtemperado por Shakespeare: “Ò admirável mundo novo em que vivem tais pessoas!”.
Os portais que nos transportam para este novo marco civilizatório são, pela ordem, a eleição do Cristo Redendotor como VII maravilha do mundo moderno (em menor escala) e os Jogos Pan-Americanos. Poderia atacar a ignorância da maior parte da imprensa que escreve “panamericanos” desconhecendo que o prefixo grego “pan” (“tudo”, “todos”) deve ser seguido por hífen quando anteceder radicais começados em “a”. Mas, ignaro sou eu por não enxergar isto: o que é um hífen ante a aurora de um novo mundo?
Após a overdose de notícias, percebi-me em um universo livre de escândalos, os políticos invisíveis como o salário de muitos brasileiros ao fim de cada mês. A moralidade está restaurada. A ética política deverá ir para o limbo de Dante e dele voltar imaculada, como a Beatriz no Sétimo Céu. O país, ajudado pelos poderosos pulmões da rede Globo, só respira Pan, Pan, Pan.
Escusado dizer do escândalo que foi a realização dos Jogos: seu orçamento inicial de 324 milhões de reais acabou por custar mais de 3 bilhões. Milhões de reais transformados em propina e alienação. Ivete Sangalo, musa e modelo primaz da nossa pérfida identidade cultural, visitou uma das arenas dos Jogos para delírio dos fãs-financiadores deste descalabro; pousou de helicóptero, saracoteou no gramado enquanto operários e torcedores, hipnotizados, bradavam em uníssono febril como se ela fosse uma deusa encarnada e de posse dum ungüento sagrado para aliviar as dores nacionais; e ela absolutamente alheia ao que ocorria se tivesse ciência de sua origem divina, não teria colocado os santos pés num templo profano.
Fechado o portal ao fim dos Jogos, voltaremos à modorra das notícias comuns tão arraigadas à paisagem do mundo real; voltará à cena o senador bovino; o grileiro inseto, o empreiteiro concretista, o presidente amorfo e todas as demais personagens que fazem do Brasil um país sui generis não pela prosperidade que dá aos seus habitantes, mas pela mágica de fazer sumir e aparecer, ao sabor dos eventos, todos os problemas que apenas imaginamos existir, Deus salve o Pan.
Escrito por Alex Menezes às 13h50
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