Esses dias fiz um esforço miserável para ficar deprimido. Não consegui. É muito aborrecível quando tento alcançar algo e não consigo. Mas não desisti. Ainda alimento esperanças. Não estou brincando com coisa séria; sei dos transtornos que a doença causa e como ela afeta a vida dos que estão próximos dos depressivos. Mas não estou para parentes e menos para amigos; estou para sentimentos.
Por tal motivo, essa minha propensão exótica de querer estar como ninguém quer estar – fato mais raro do que encontrar um escravo escravocrata – pode despertar sentimentos difusos entre os que me leem. Explicarei. Ou tentarei. Ou enfim.
Na depressão, os níveis hormonais que orientam o estado de “bem-estar” vão a mingua; tudo é cinza (ou azul?), o vento é tétrico e o céu, mesmo estrelado, é como que salpicado por pontos luminosos de dor, que o brilho, em vez de brilhar, lateja como se ele fora uma dor que se dê a ser visualizada.
Os deprimidos enxergam o mundo como ninguém. Este é o meu objetivo de querer ficar assim: enxergar o mundo como ele é. Captando o mundo como ele de fato é, sem os placebos do consumismo, o gélido-gostoso pavor de descer na montanha russa, o leite fumegando num bule de argento, o amor bem-feito e sem pressa e outras delícias que camuflam o desastre insano que é o mundo real; por isso eles se entristecem e querem a morte e querem apagar, já que são impotentes em apagar a dor do mundo.
Faz-se também arte na melancolia; é quando os “doentes” transmutam para as telas, livros, música, escultura, telas (cinema) e outras expressões artísticas, o mundo nu, sempre cruel, violento, sarcástico e pedregoso que tanto maltrata a gente; e a gente sempre (com raras exceções) quer se manter sobre ele, teimosos, equilibrando-se nesta corda bamba incrustada de espinhos.
Em São Paulo, um pai esqueceu dentro do carro o bebê, que veio a falecer por hipertermia; nem sei o que é mais doloroso, se a dor do pai ou o desperdício da vida do filho, que tinha um bocado de vida pela frente para saborear ou para sentir dissabor; viver com dissabor é um modo de engolir um molho amargo, mas necessário.
Escrito por Alex Menezes, às 19h23.
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