A revista Piauí fez uma entrevista interessante com o ex-presidente Itamar Franco. De cara ele pediu ao jornalista que o entrevistou para que não o chamasse de “presidente”. Curioso. Fui num encontro literário com um ex-presidente da República e todos os presentes se desfizeram em mesuras; era “presidente” para lá, cá e acolá. Eu o chamei apenas pelo primeiro nome, que em hebraico quer dizer “aquele que acrescenta” (José), mas tirei foto com ele, o que denota que concentro em mim alguma fraqueza de caráter e sei lá mais o quê. Itamar Franco me conquistou. Num momento, ele falou que um assessor lhe perguntou o que ele achava da Taís, e ele respondeu “sei lá quem é Taís!”. Perguntaram-me o que eu achava da Taís. É claro que respondi. Falei ao interlocutor que era um absurdo aquela cortesã insana incendiar o magnífico palácio de Persépolis... ei, ela não botou fogo em palácio nenhum não, me interrompeu ele. Foi aí que me dei conta de que falávamos de moças diferentes... achei estranha aquela pergunta vinda de um noveleiro de plantão.
Punir Maradona por uso de efedrina me entristece. Tudo o que é popular demais me soa grotesco. Filme sobre os traficantes, o atual presidente, as novelas idiotizantes, os reality shows da morte. Raramente uma coisa que cai no gosto do povaréu realmente tem algum valor, estético, moral. Os engarrafamentos nos feriados prolongados são sintomáticos: nada mostra melhor que o povo é uma massa desordenada que se comporta com insensatez quando num estranho fenômeno todos decidem fazer uma mesma coisa no mesmo tempo. Nietzsche ensinou que o povo é o rodeio que a natureza faz para chegar as meia dúzia de homens que prestam.
Uma das maiores fraudes dogmáticas é a que projeta o conceito de que “a voz do povo é a voz de Deus”. Não é. Foi a “voz do povo” que mandou o Cristo para a estaca de tortura. “mas os principais sacerdotes (judeus) e anciões persuadiram as multidões a pedir Barrabás e fazer Jesus ser destruído”, Mateus, 24: 20. Não é de hoje que o povo é usado como massa de manobra dos poderosos. Sempre foi assim em todos os impérios. A novidade agora é que o povo toma suas atitudes de moto-próprio apenas com um empurrãozinho da mídia, a atual governadora dos homens.
O mundo hoje é norteado pelo que acontece na TV. São os pedagogos do novo milênio. De Oprhah Winfrey e David Lettermann no EUA a Angélica e Pedro Bial no Brasil, tudo é dirigido pelo que esses gurus sociais mandam e até quase obrigam a fazer. Uma propaganda da Xuxa vale mais do que tudo o que Jean Piaget fez pela educação ou Monteiro Lobato pela juventude. Uma ordem do Gugu Liberato para tomar dinheiro emprestado no banco do seu patrão se equipara em poder a uma encíclica do Vaticano. Hebe Camargo, a maior autoridade sobre legislação penal do país, pode ser santificada não quando morrer, como seria natural, mas quando simplesmente solicitar esse mimo todo particular para lustrar sua bonomia. Raul Gil, Ana Maria Braga, Luciano Huck, Adriane Galisteu, toda essa gama de gente ajuda a explicar o atual estado de coisas do Brasil. Antes precisávamos ler “Raízes do Brasil”, do Sergio Buarque, “Casa Grande & Senzala” do Gilberto Freire, coisas por demais pesadas e entendiantes com o gravame que as explicações contidas nestes catataus carecem de reflexão, interpretação e bom humor. O pessoal da TV dispensa esses enfados. Dizem tudo de modo cru, sem meias palavras, e o povão, claro, segue-os e a-do-ra.
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