Como somos uma versão tropical da Suíça, aquelas entidades disfarçadas de gente que permeiam e obliteram nossas vidas via Brasília não se preocupam com outra coisa senão o caráter. Não o caráter, esse membro imaterial do corpo humano, mas o “a caráter” --- como nos sarcófagos, o que importa é o externo, o interno se putrefaz e o aroma muda nada.
Eles se mobilizaram para proibir que os nobres deputados e senadores usem bombacha, chapéu de vaqueiro e outros assessórios extravagantes no Parlamento. Fere o decoro, garantiu um deles.
Por essas e más outras é que os políticos são odiados até pelas suas mães, se as tiverem alguns deles. Zombar dos indolentes eleitores faz parte do mandato porque o povo lhes outorga imputabilidade.
O professor de Processo Penal, quando arrazoávamos acerca dos flagelos nacionais, disse com propriedade, em plena aula, que num país em que o Big Brother alcança a 7º edição não pode ser levado a sério. E não será. Nunca. Jamais. Estamos fadados à ignomínia eterna, à miséria solene. Consumir-se-á o combustível do sol por inteiro daqui uns 4,5 bilhões de anos e permaneceremos firmes no propósito de sermos o modelo de mediocridade e vergonha, pobres como ratos, tão execráveis quanto estes.
Nada disso é, no entanto, culpa de modelos ou ideologias políticas adotadas por nossa classe dominante, seja política, econômica ou cultural. Eu, por exemplo, não sou nada por crer que a Esquerda se vendeu à Direita e esta pagou àquela com cheques sem fundos.
Hoje é dia de citar professores conspícuos.
Dias atrás, Leandro Karnal, em resposta a um e-mail que lhe enviei, se queixou de um vírus gripal que o aborrecia e assim resumiu o estado letárgico em que se encontrava: “Estou nesses dias em que a existência não vale a pena”. Nunca vou me esquecer desta oração.
Ver não o que os políticos fazem (o ofício do político é politicar), mas sim o que o próprio povo faz consigo mesmo todos os dias, ignorando seus direitos, vendo violados outros e permanecendo nesta mesma pasmaceira por comodidade e ignorância, me faz ver que existir neste país vale cada dia menos --- não a pena, mas a ave inteira.
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