O cineasta do norte da América Terence Malick dirigiu um filme sobre o Tudo, que mais parece ser sobre o Nada. Árvore da Vida é uma fita precária no tom, na forma e na paciência. Nem por isso deve ser esfolada, porque é aí que reside sua surpreendência, se é que cabe um neologismo numa hora dessas.
Primeiro que o filme é calcado em conceitos cristãos piegas, a começar pelo título que evoca um Genesis necessário como representação da origem, o que religiosamente é correto, mas artisticamente é duvidoso.
O abuso do que Contardo Calligaris chamou de “national geographic” pelas imagens etéreas do etéreo e do palpável que rescende desde o ab ovo (início de tudo) até as misérias que o fato de existir nos faz consumir quotidianamente.
O roteiro fragmentário trata de uma família típica do meio oeste dos EUA, em que um pai que se esforça para ser durão com os filhos e força a barra para ser a representação da “Natureza”, esse ente misterioso que provê e castiga com a mesma graça, pois, em se tratando de natureza, não há julgamentos morais, apenas ação que pode resultar em deleite ou flagelo --- o incompreensível não filtra males nem benesses.
Com este simulacro de roteiro, Mallick quer mesmo experimentar o imponderável e justificar a incoerência da existência com tintas surreais, e isto fica claro ao mencionar o capítulo bíblico do judeu Jó, que, vergado pela bonança, acaba por se refugiar no Deus hebreu quando a miséria lhe bate às portas, permanecendo firme porém estúpido diante de uma calamidade que jamais poderia supor oriunda do seu Deus-Provedor.
Tecnicamente, o filme é cansativo e até audacioso demais, sobretudo na fotografia e no fantástico uso de um ator do quilate de um Sean Penn mudo, apenas inconformado com a brutalidade urbana, sobrecarregada de prédios --- estes usados como metáfora do vazio cheio de concreto da atual civilização --- e da indiferença do deus-tempo, que segue firme enquanto outros são esmagados pelo caminho (caso do irmão que perde na adolescência).
O final sentimentalmente gratuito de todos se encontrando numa praia amorfa serve como exercício de zombaria aos mecanismos do destino, pois tudo parece dramaticamente convergir para um fim unipolar, em que bons e maus terão o mesmo miserável destino: ter de se enfrentar para dissipar ou emular com seus demônios.
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